Texto - "Alexandre Herculano" Manoel Caldas Cordeiro

feche e comece a digitar
Em Inglaterra os romances de Scott invocavam a idade-média as cruzadas, os velhos burgos.

Poetas, romancistas, escritores pendiam para os estudos e para a crítica histórica.

Os romances mesmo e as memórias, que tão cultivadas têm sido nos últimos cinquenta anos deste século, são apenas variedades da história e da crítica. O pensamento do romancista é idêntico ao do crítico e do historiador. Tem de documentar e historiar um meio, uma época, onde se agitam personagens contemporâneos ou remotos. É assim que nos livros do sr. Henry James, nesses pequenos contos, que nos parecem rabiscos na mesa de fumar d'algum rico hotel das grandes cidades, está toda a vida, toda a ência, toda a nostalgia, e todas as hesitações nervosas dessa geração fluctuante, que emigrou para a América, se regenerou e fortificou ao contacto d'outro meio e d'outro clima, e só se definha e sofre, quando inveja e macaqueia essa velha Europa, onde tantos vêm matar as saudades e dessedentar a sede dos vícios mórbidos que herdaram.

Quando há cinquenta anos apareceu o Monge de Cister, o romance histórico não existia em Portugal. Como reflexo pálido da literatura inglesa, aparecerá entre nós uma ou outra tentativa isolada e obscura. Foi Herculano que o vulgarizou; ele mesmo nas Lendas e Narrativas o confessa, orgulhando-se que os seus ensaios provocam a publicação do Arco de Sant'Ana, do Ano na Côrte, Odio Velho, O Conde de Castella, Irmãos Carvajales, O que foram Portuguezes. Estes trabalhos, exceto o primeiro, são produtos medíocres de cérebros cansados; a curiosidade que os recebeu tombou, com o tempo, em gélida indiferença.

Quem lê os romances de Herculano não pode procurar d'elles nem a analyse da vida, nem mesmo o estudo exacto da época em que se passam. O poeta triumph sempre e, se aqui e ali, aparece o historiador - ou melhor o cérebro transbordando de conhecimentos históricos e obrigado a revelar-os em tudo quanto escrevesse - o visualizador sempre nos arrasta e empolga com as suas ilusões. O que vibra com uma intuição admirável nos seus romances, é a nota desesperante do amor. As paixões desses personagens eram um fogo que os minava e consumia. A religião e o despotismo medieval carregaram ainda mais funebremente o espírito dos bárbaros. Qualquer sentimento que os escravizado, era para esses brutais uma força, como que sobre humana, contra a qual lutavam, subjugados pelas superstições e pelos prejuízos.

O Egas Moniz do Bobo, o Eurico, o Vasco do Monge de Cister, o D. Fernando das Arras por foro de Hespanha são entes que se movem na vida sob a acção dominadora de um amor, tão despótico como a tyrannia dessa idade de ferro. Estes amorosos são como leões algemados que a cada instante rugem o seu desespero.