Belo ermo! eu hei-de amar-te, em quanto esta alma,
Aspirando o futuro além da vida,
E um hálito dos céus, gemer, atada
Á columna do exílio, a que se chama,
Em língua vil e mentirosa, o mundo.
Eu hei-de amar-te, oh valle, como um filho
Dos sonhos meus. A imagem do deserto
Guardá-la-ei no coração, bem junto
Com minha fé, meu único tesouro.
Qual pomposo jardim de verme illustre,
Chamado rei ou nobre, há-de comtigo
Comparar-se, oh deserto? - Aqui não cresce
Em vaso de alabastro a flor captiva,
Ou árvore educada, por mão do homem,
Que lhe diga: és escrava: e erga um ferro,
E lhe decepou os troncos. Como é livre
A vaga do oceano, é livre no ermo
A bonina rasteira, e o freixo altivo:
Não lhes diz: nasce aqui, ou lá não cresças:
Humana voz. Se baqueou o freixo,
Deus o mandou; se a flor pendida murcha,
É que o rocio não desceu de noite,
E da vida o Senhor lhe nega a vida.
Céu livre, terra livre, é livre a mente,
Paz íntima, e saudade, mas saudade
Que não doí, que não mirra, e que consola
São as riquezas do ermo, onde sorriem
Das procellas do mundo os que o deixaram.
Ah, na branda encosta, ontem de noite,
Almejava por entre as azinheiras
Do solitário a habitação tranquilla:
E eu vagueei por lá: patente estava
O pobre albergue do eremita humilde,
Onde jazia o filho da esperança,
Sob as asas de Deus, à luz dos astros,
Em leito, duro sim, não de remorsos,
Oh, com quanto sossego o bom do velho
Dormia! - A leve aragem lhe ondeava
As raras cães na fronte, onde se lia
A bela história de passados anos.
De alto choupo através passava um raio
Da lua - astro de paz, astro que chama
Os olhos para o céu, e a Deus a mente -
E em luz pallida as faces lhe banhava:
E talvez neste raio o Pai celeste
Da pátria eterna lhe enviava a imagem,
Que o sorriso dos lábios lhe fugia,
Como se um sonho de ventura e glória
Na terra de antemão o consolasse.
E eu comparei o solitário obscuro
Ao inquieto filho das cidades;
Comparei o deserto silencioso
Ao perpétuo ruído que sussurra
Pelos palácios do abastado e nobre,
Pelos paços dos reis; e condói-me
Do cortesão soberbo, que só cura
De honras, haveres, glória, que se compram
Com maldições e perennial remorso.
Glória! - A sua qual é? - Pelas campinas,
Cobertas de cadáveres, regadas
De negro sangue, ele cegou seus louros;
Louros que vão cingir-lhe a fronte altiva,
Ao som do choro da viúva, e do orphan;
Ou, dos sustos senhor, em seu delírio,
Os homens - seus irmãos - flagella e opprime.
Lá o filho do pó se julga um nume,
Porque a terra o adorou: o desgraçado
Pensa, talvez, que o verme dos sepulcros
Nunca se há-de chegar, para tragá-lo,
Ao banquete da morte, imaginando
Que uma laje de mármore, que esconde
O cadáver do grande, é mais durável
Do que esse chão sem inscrição, sem nome,
Por onde o oppresso, o mísero, procura
O repouso, e se atira aos pés do throno
Do Omnipotente, a demandar justiça
Contra os fortes do mundo - os seus tyrannos.
Aspirando o futuro além da vida,
E um hálito dos céus, gemer, atada
Á columna do exílio, a que se chama,
Em língua vil e mentirosa, o mundo.
Eu hei-de amar-te, oh valle, como um filho
Dos sonhos meus. A imagem do deserto
Guardá-la-ei no coração, bem junto
Com minha fé, meu único tesouro.
Qual pomposo jardim de verme illustre,
Chamado rei ou nobre, há-de comtigo
Comparar-se, oh deserto? - Aqui não cresce
Em vaso de alabastro a flor captiva,
Ou árvore educada, por mão do homem,
Que lhe diga: és escrava: e erga um ferro,
E lhe decepou os troncos. Como é livre
A vaga do oceano, é livre no ermo
A bonina rasteira, e o freixo altivo:
Não lhes diz: nasce aqui, ou lá não cresças:
Humana voz. Se baqueou o freixo,
Deus o mandou; se a flor pendida murcha,
É que o rocio não desceu de noite,
E da vida o Senhor lhe nega a vida.
Céu livre, terra livre, é livre a mente,
Paz íntima, e saudade, mas saudade
Que não doí, que não mirra, e que consola
São as riquezas do ermo, onde sorriem
Das procellas do mundo os que o deixaram.
Ah, na branda encosta, ontem de noite,
Almejava por entre as azinheiras
Do solitário a habitação tranquilla:
E eu vagueei por lá: patente estava
O pobre albergue do eremita humilde,
Onde jazia o filho da esperança,
Sob as asas de Deus, à luz dos astros,
Em leito, duro sim, não de remorsos,
Oh, com quanto sossego o bom do velho
Dormia! - A leve aragem lhe ondeava
As raras cães na fronte, onde se lia
A bela história de passados anos.
De alto choupo através passava um raio
Da lua - astro de paz, astro que chama
Os olhos para o céu, e a Deus a mente -
E em luz pallida as faces lhe banhava:
E talvez neste raio o Pai celeste
Da pátria eterna lhe enviava a imagem,
Que o sorriso dos lábios lhe fugia,
Como se um sonho de ventura e glória
Na terra de antemão o consolasse.
E eu comparei o solitário obscuro
Ao inquieto filho das cidades;
Comparei o deserto silencioso
Ao perpétuo ruído que sussurra
Pelos palácios do abastado e nobre,
Pelos paços dos reis; e condói-me
Do cortesão soberbo, que só cura
De honras, haveres, glória, que se compram
Com maldições e perennial remorso.
Glória! - A sua qual é? - Pelas campinas,
Cobertas de cadáveres, regadas
De negro sangue, ele cegou seus louros;
Louros que vão cingir-lhe a fronte altiva,
Ao som do choro da viúva, e do orphan;
Ou, dos sustos senhor, em seu delírio,
Os homens - seus irmãos - flagella e opprime.
Lá o filho do pó se julga um nume,
Porque a terra o adorou: o desgraçado
Pensa, talvez, que o verme dos sepulcros
Nunca se há-de chegar, para tragá-lo,
Ao banquete da morte, imaginando
Que uma laje de mármore, que esconde
O cadáver do grande, é mais durável
Do que esse chão sem inscrição, sem nome,
Por onde o oppresso, o mísero, procura
O repouso, e se atira aos pés do throno
Do Omnipotente, a demandar justiça
Contra os fortes do mundo - os seus tyrannos.