Texto - "Quéda que as Mulheres Têm para os Tolos" Victor Hénaux

feche e comece a digitar
O homem de espírito, assustado com o vácuo imenso, que deixa no
coração uma afeição que se perde, só rompe o laço que o prende à
causa de dilacerações interiores.

Como bem se disse, sendo preciso um dia para conseguir, é preciso
mil para se reconquistar.

Mesmo no momento em que volta a ser livre: quantas vezes um sorriso,
um meneio de cabeça, uma maneira de puxar o vestido, ou de inclinar o
chapelinho de sol, não o faz recair no seu antigo captiveiro!

De resto, a mulher, a quem ele tiver revelado o segredo do seu
coração, ficará sempre para ele como ser aparte. Não a esquece nunca.

Morta, ou separado, nutre por aquela que a perdeu longas saudades.
Perseguido pela lembrança que dela conserva, descobre muitas vezes
que as outras mulheres por quem se apaixona só têm o mérito de se
parecerem com ella. Dá-se ele então a comparações que o esvaíram,
que o irritam, que o põe fora de si, exigindo no seu trajar, no seu
andar e até no seu falar, alguma cousa que lhe recorde o seu
implacável ideal.

E se é ele o abandonado, que de torturas que soffre!

Viver sem ser amado parece-lhe intolerável. Nada pode consolar-o ou
distrai-o.

No caso de tornar a ver os sítios que foram testemunhas da sua
felicidade, evoca á sua memoria mil circunstâncias perseverantes e
cruéis. Alli está a cerca cheirosa, cujos espinhos rasgam o véu da
infiel; aqui, o rio que a medrosa só ousava atravessar amparada pela
sua mão; além está a alameda, cuja areia fina parece ter ainda o molde
de seus ligeiros passos. Contempla na janela as longas e alvas
cortinas, no peitoril os arbustos em flor, na relva a mesa, o banco,
as cadeiras em que outrora se sentaram.

É possível que ela tenha mudado tão de repente? Pois não foi ainda
hontem que de volta de um passeio ao bosque, lhe enxugou o suor da
testa, e que se lhe prendia em doce e estranho amplexo?... Hoje, nem
mais doçuras, nem mais apertos de mão, nem mais dessas horas ebrias
em que todo o passado ficava esquecido! Ele está só, entregue a si
mesmo, sem força, sem alvo: é o delírio do desespero.

O tolo está acima dessas misérias. Não o assusta um futuro prenhe de
qualquer inquietação afflictive. Sempre acobertado pela bandeira de
inconstância, desfaz-se de uma amante sem luta, nem remorso; utiliza
uma traição para voar a novas aventuras. Para ele nada há de terrível
em uma separação, porque nunca supõe que se possa colocar a vida
numa vida alheia, e que fazendo-se um hábito dessa comunidade
de existência, faz-se pouco novamente sofrer, quando ela tiver de
quebrar-se.

Da mulher, que deixa de amar, ele só conserva o nome, como o veterano
conserva o nome de uma batalha para glorificar-se, juntando-o ao
número das suas campanhas.