Texto - "Descobrimento das Filippinas pelo navegador portuguez Fernão de Magalhães" Caetano A. da Silva

feche e comece a digitar
E que outro podia ser que um português a devassar os mares, a circundar o globo?!

Que de empresas arrojadas; que de feitos d'armas; que de acções generosas; que de progressos das ciências se poderão apontar na história, que não encontreis á sua frente primeiro entre os primeiros:-o portuguez.

Ah! que até chego a duvidar se estou acordado ou sonhando, quando ouço para ahi tanto pessimismo a amesquinhar o nosso valor, a duvidar, a descrer de nós próprios!

Não há talvez outro exemplo de uma nacionalidade assim!

Tão grande; tão prestimosa; tão brilhante, que o seu nome está escripto no mundo inteiro, pelos mares, nas ilhas, nos continentes, nos mais recônditos sertões e até nos astros-como adiante veremos-e que tão pouco julgue de si; tendo-se por fraca quando tanto é o seu valor; julgando-se pobre quando é tão rica, que tem do prodigamente a outros e tanto ainda lhe resta para si; que tendo uma história tão gloriosa como outra não há, pense que não é dela que há de viver, como se fosse uma Roma caída, que já não tem a girar-lhe nas veias o mesmo sangue com que escreveu essa história!

Mas então o que valem os feitos dos nossos soldados, que ainda nos princípios deste século se batiam e levaram de vencida as legiões do primeiro capitão, que avassalou o mundo com a sua espada e que veio encontrar, neste recanto da península, os primeiros reveses da guerra que o levaram por fim a Santa Helena:-O grande Bonaparte!; mas que valem, em nossos dias essas vitórias alcançadas em África; que despertam a admiração do mundo; que significa ainda o triumpho que neste momento as armas portuguesas estão alcançando na Oceania?; o que vale o ressurgir das nossas artes, que vão honrar o nome português nos certames onde concorrem os artistas de todo o mundo, como agora, em Berlim; que glória nos vem de um dramaturgo português Pinero (Pinheiro), em Inglaterra, alcançar os maiores triumphos nos teatros de Londres, e das suas peças percorrerem toda a América; para que orgulhamo-nos dos Lusíadas que é um poema eterno porque canta as glórias de um povo de guerreiros e de navegadores; para que serve a expansão deste inglês pequeno, cujos seus filhos afirmam a vitalidade da pátria pelas cinco partes do mundo, em colônias tão importantes como as da América, da África, da Oceania e da Ásia; que importância têm os nossos homens scientificos que se distinguem nos congressos onde se reúnem as sumidades da ciência; o que quer dizer essa lucta da indústria português a medir-se com as indústrias de outros paises mais adiantados, suprindo as necessidades de um povo civilizado a que a má administração das suas finanças acarretou uma crise econômica; o que importa o renascimento de um país que em meio século tem realizado todos os progressos que o aproximam das nações mais cultas?

Serão próprios de uma raça degenerada, de um país perdido, de uma civilização extincta, todas estas manifestações de vida, afirmações de força, de lucta pela existência, sob um sol criador, numa terra uberrima, que se desentranha em fructos, que encerra tesouros, em suas minas, fertilizada por abundantes rios, que tem tudo que há em outros países e mais o que eles não teem, que é rica, enfim, de todos os bens que a natureza possui e que Deus parece ter reunido aqui como no paraíso terreal!

E para que foi que este povo, achando-se apertado no solo que as suas espadas conquistaram, se aventurou aos mares a alçar a sua bandeira em terras até então desconhecidas, levantando impérios na Índia e na America, avassalando novos mundos onde a família português pode viver como na pátria porque são pátria também de portugueses.

Mas basta. Não enumeramos mais o que deveria estar na lembrança de todos os filhos de Portugal, o que nunca deveriam esquecer, porque é esquecerem-se da sua nacionalidade, do que prova a sua existência e autonomia, do que dá razão da sua vida através de todas as vicissitudes porque tem passado.

Pois quê! se Portugal não fosse um elo importante da cadeia que liga a grande família da humanidade, teria resistido aos embates da sorte que tantas vezes o hão experimentado?

Se ele não tivesse concorrido tão vastamente para a civilisação que o mundo disfruta, como teria atravessado por entre os séculos e lutado contra as ambições de estranhos que tentaram apagar dos mappas as linhas que demarcam as suas fronteiras!

A Polonia succumbe sob o grande collosso porque a sua nacionalidade não coopera na transformação porque o mundo passa ao sahir da idade média; o mesmo acontece à Hungria. Veneza cahiu quando as novas descobertas empanam o brilho da sua navegação e do seu commercio.

Portugal existe e vive porque o ciclo da civilização de que ele lançou os primeiros segmentos ainda não se fechou.