O antigo espírito clássico, que produzirá as magníficas civilizações da Grécia e de Roma, esmorecia, como esmagado sob o peso da sua própria e grandiosa obra, quando dois elementos novos, talvez regulados pela lei suprema da conservação e do perpetuo rejuvenescimento da Humanidade, se manifestaram com profundo vigor e intensidade no seio das velhas sociedades decadentes: o Cristianismo e a invasão dos bárbaros.
Assim, os fatos históricos, as ideias e os sentimentos humanos, as instituições sociais, a moral, a política e a arte, se explicam pela ação recíproca e poderosa dos três princípios, o clássico, o cristão e o bárbaro, que são as causas eficientes da idade media e da civilização moderna.
Já no tempo de César e de Augusto, os primeiros Imperadores, cuja grandeza de gênio é incontestável, a sociedade romana entrará em plena decadência. Os vícios da antiga República, que os bons cidadãos e os filósofos contemporâneos não haviam podido expungir, cavaram-lhe a ruína.
O Império correspondia, sem dúvida, às necessidades de corrigir ardentes ambições em contínuas lutas, que produzem sempre a anarquia política, e de imprimir ação enérgica e centralizadora à enorme expansão das conquistas; mas o Império trazia na própria essência dois vícios terríveis e inevitáveis: o despotismo, a extinção completa das últimas liberdades públicas, e a constituição militar, como poder especial independente dos cidadãos, o militarismo segundo a expressão moderna.
Na agonia da República, Catão de Útica previram o desastre. Lutará para o evitar, chegando até a apontar o homem, Júlio César, que devia destruir o quase fantasma da antiga liberdade romana. O futuro Ditador, ainda muito novo, espreitava e preparava, entre os prazeres dos ricos e dos poderosos da Roma republicana, pelo amor das mulheres, pela elegância, pelos costumes fáceis e até pela lisonja, a origem da grandeza, que mais tarde encontrou no proconsulado das Gallias.
Assim também, Napoleão, frequentando os salões políticos e literários do Diretório republicano, conseguiu ser nomeado general em chefe dos exércitos da Itália. Singular coincidência entre dois homens de carácter tão parecido, dois gênios inegavelmente; um procura nas Gallias, a França, outro na Itália, a República Romana, as origens de futuros impérios!
Durante o Império, pelo menos nos primeiros tempos, as ambições foram enfrentadas pela existência do poder perpétuo da ditadura; mas, se algumas das antigas instituições conservaram os nomes, foram-lhes tiradas a pouco e pouco as últimas funções. Os fracos lampejos da liberdade republicana em breve se extinguiram na escuridão profunda do mais feroz despotismo, até hoje conhecido. O César era ditador e pontífice-máximo, o soberano absoluto dos povos e o chefe espiritual das consciências.
Também é certo que a energia da centralização política e administrativa do Império facilitou o espírito conquistador e a conservação das conquistas, mais do que o podia fazer a esfacelada República; mas, como consequência lógica, estas mesmas condições favoráveis prepararam o militarismo. Os exércitos nacionais da República tornaram-se as legiões cesarianas do Império, que lhes pagava e as dirigia, transformando-se a pouco e pouco em guardas do Imperador. Era natural e lógica esta confusão entre o homem e o princípio. A nação, o povo, a liberdade, os direitos dos cidadãos, tudo desaparecera encarnado na pessoa de um Cesar deificado.
Os resultados eram fatais. Tibério criou as guardas pretorianas para defesa da pessoa do Imperador. Sentindo a sua força, os pretores imperiais completaram depois logicamente a doutrina e as guardas pretorianas começaram a escolher os Césares.
O despotismo e a centralização do Império acentuaram, assim, as causas da decadência da sociedade romana, dando-lhe, apenas, por algum tempo um falso aspecto de força e de grandeza.
Nos últimos anos da República era já, na realidade, profunda a desmoralização das classes superiores. O ouro das depredações, feitas nas províncias conquistadas, os costumes luxuosos e dissolutos, importados com o ouro dos povos orientais, os grandes latifúndios, em que se dividia a Itália, possuídos por famílias poderosas, haviam amolecido a antiga rigidez do caráter romano. São ainda hoje citadas e célebres as prodigalidades da magnificência e do luxo de Lucullo, questor da Ásia.
As despesas excessivas de um estado de guerra constante em regiões diferentes e afastadas, a defesa de vastíssimas fronteiras, já então ameaçadas em mais de um ponto, as estradas e as respectivas obras, pontes, castelos, campos entrincheirados, que constituíam a admirável rede de comunicações militares romanas dentro e fora da Itália, as espoliações dos grandes e pequenos funcionários, exigiam o ardor do fisco, motivaram-lhe as violências, exercendo-se, como sempre, sobre as classes populares.
Estas péssimas sementes, lançadas no campo da democracia, ainda haviam sido contrariadas durante a República por instituições e franquias populares. O Império, nivelando a sociedade abaixo de um César deificado de quem tudo e todos dependiam, extinguindo as últimas liberdades, criando uma espécie de côrte de grandioso fausto, que no tempo de Elagabalus atingiu as loucuras orientais nos costumes e no luxo, desenvolvendo por necessidade o espírito e as forças militares, acentuou estas causas de decadência. Nos começos do Império, um philosopho epicurista, Petrônio, deixou-nos uma face viva d'esse estado moral e social, numa sátira célebre e cheia de vigorosa ironia, o Satyricon.
A religião politeísta perderá o prestígio e a força. As classes superiores professavam um epicurismo devasso, elegante e ateu. O povo, sem crenças, debatia-se na miséria politica e econômica. Os mitos do politeísmo podiam interessar imaginações ardentes e poéticas; mas não consolava desgraçados, que sobre a terra sentiam apenas, sem uma esperança, a rudeza do trabalho, as crueldades da dor e o receio da morte.
Os deuses tinham perdido o seu prestígio, porque não fazem milagres; esses deuses alegres e devassos, que aceitavam os Césares por colegas e o deixavam, a ele, pobre povo, sofrer e morrer de fome, mais miserável e esquecido do que as bestas das cavalariças imperiais...
Assim, os fatos históricos, as ideias e os sentimentos humanos, as instituições sociais, a moral, a política e a arte, se explicam pela ação recíproca e poderosa dos três princípios, o clássico, o cristão e o bárbaro, que são as causas eficientes da idade media e da civilização moderna.
Já no tempo de César e de Augusto, os primeiros Imperadores, cuja grandeza de gênio é incontestável, a sociedade romana entrará em plena decadência. Os vícios da antiga República, que os bons cidadãos e os filósofos contemporâneos não haviam podido expungir, cavaram-lhe a ruína.
O Império correspondia, sem dúvida, às necessidades de corrigir ardentes ambições em contínuas lutas, que produzem sempre a anarquia política, e de imprimir ação enérgica e centralizadora à enorme expansão das conquistas; mas o Império trazia na própria essência dois vícios terríveis e inevitáveis: o despotismo, a extinção completa das últimas liberdades públicas, e a constituição militar, como poder especial independente dos cidadãos, o militarismo segundo a expressão moderna.
Na agonia da República, Catão de Útica previram o desastre. Lutará para o evitar, chegando até a apontar o homem, Júlio César, que devia destruir o quase fantasma da antiga liberdade romana. O futuro Ditador, ainda muito novo, espreitava e preparava, entre os prazeres dos ricos e dos poderosos da Roma republicana, pelo amor das mulheres, pela elegância, pelos costumes fáceis e até pela lisonja, a origem da grandeza, que mais tarde encontrou no proconsulado das Gallias.
Assim também, Napoleão, frequentando os salões políticos e literários do Diretório republicano, conseguiu ser nomeado general em chefe dos exércitos da Itália. Singular coincidência entre dois homens de carácter tão parecido, dois gênios inegavelmente; um procura nas Gallias, a França, outro na Itália, a República Romana, as origens de futuros impérios!
Durante o Império, pelo menos nos primeiros tempos, as ambições foram enfrentadas pela existência do poder perpétuo da ditadura; mas, se algumas das antigas instituições conservaram os nomes, foram-lhes tiradas a pouco e pouco as últimas funções. Os fracos lampejos da liberdade republicana em breve se extinguiram na escuridão profunda do mais feroz despotismo, até hoje conhecido. O César era ditador e pontífice-máximo, o soberano absoluto dos povos e o chefe espiritual das consciências.
Também é certo que a energia da centralização política e administrativa do Império facilitou o espírito conquistador e a conservação das conquistas, mais do que o podia fazer a esfacelada República; mas, como consequência lógica, estas mesmas condições favoráveis prepararam o militarismo. Os exércitos nacionais da República tornaram-se as legiões cesarianas do Império, que lhes pagava e as dirigia, transformando-se a pouco e pouco em guardas do Imperador. Era natural e lógica esta confusão entre o homem e o princípio. A nação, o povo, a liberdade, os direitos dos cidadãos, tudo desaparecera encarnado na pessoa de um Cesar deificado.
Os resultados eram fatais. Tibério criou as guardas pretorianas para defesa da pessoa do Imperador. Sentindo a sua força, os pretores imperiais completaram depois logicamente a doutrina e as guardas pretorianas começaram a escolher os Césares.
O despotismo e a centralização do Império acentuaram, assim, as causas da decadência da sociedade romana, dando-lhe, apenas, por algum tempo um falso aspecto de força e de grandeza.
Nos últimos anos da República era já, na realidade, profunda a desmoralização das classes superiores. O ouro das depredações, feitas nas províncias conquistadas, os costumes luxuosos e dissolutos, importados com o ouro dos povos orientais, os grandes latifúndios, em que se dividia a Itália, possuídos por famílias poderosas, haviam amolecido a antiga rigidez do caráter romano. São ainda hoje citadas e célebres as prodigalidades da magnificência e do luxo de Lucullo, questor da Ásia.
As despesas excessivas de um estado de guerra constante em regiões diferentes e afastadas, a defesa de vastíssimas fronteiras, já então ameaçadas em mais de um ponto, as estradas e as respectivas obras, pontes, castelos, campos entrincheirados, que constituíam a admirável rede de comunicações militares romanas dentro e fora da Itália, as espoliações dos grandes e pequenos funcionários, exigiam o ardor do fisco, motivaram-lhe as violências, exercendo-se, como sempre, sobre as classes populares.
Estas péssimas sementes, lançadas no campo da democracia, ainda haviam sido contrariadas durante a República por instituições e franquias populares. O Império, nivelando a sociedade abaixo de um César deificado de quem tudo e todos dependiam, extinguindo as últimas liberdades, criando uma espécie de côrte de grandioso fausto, que no tempo de Elagabalus atingiu as loucuras orientais nos costumes e no luxo, desenvolvendo por necessidade o espírito e as forças militares, acentuou estas causas de decadência. Nos começos do Império, um philosopho epicurista, Petrônio, deixou-nos uma face viva d'esse estado moral e social, numa sátira célebre e cheia de vigorosa ironia, o Satyricon.
A religião politeísta perderá o prestígio e a força. As classes superiores professavam um epicurismo devasso, elegante e ateu. O povo, sem crenças, debatia-se na miséria politica e econômica. Os mitos do politeísmo podiam interessar imaginações ardentes e poéticas; mas não consolava desgraçados, que sobre a terra sentiam apenas, sem uma esperança, a rudeza do trabalho, as crueldades da dor e o receio da morte.
Os deuses tinham perdido o seu prestígio, porque não fazem milagres; esses deuses alegres e devassos, que aceitavam os Césares por colegas e o deixavam, a ele, pobre povo, sofrer e morrer de fome, mais miserável e esquecido do que as bestas das cavalariças imperiais...